O passado
"Há
vária gente que não gosta de evocar o passado. Uns por energia,
disciplina prática e arremesso. Outros por ideologia progressista, visto
que todo o passado é reaccionário. Outros por superficialidade ou
secura de pau. Outros por falta de tempo, que todo ele é preciso para
acudir ao presente e o que sobra, ao futuro. Como eu tenho pena deles
todos. Porque o passado é a ternura e a legenda, o absoluto
e a música, a irrealidade sem nada a acotovelar-nos. E um aceno doce de
melancolia a fazer-nos sinais por sobre tudo. Tanta hora tenho gasto na
simples evocação. Todo o presente espera pelo passado para nos comover.
Há a filtragem do tempo para purificar esse presente até à fluidez
impossível, à sublimação do encantamento, à incorruptível verdade que
nele se oculta e é a sua única razão de ser. O presente é cheio de
urgências mas ele que espere. Ha tanto que ser feliz na impossibilidade
de ser feliz. Sobretudo quando ao futuro já se lhe toca com a mão. Há
tanto que ter vida ainda, quando já se a não tem..."
Vergílio Ferreira
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