Memórias
Acabado
o curso foi tempo de casar e um ano depois nascia a minha filha mais
velha. Numa altura em que as minhas amigas faziam mestrados, eu
preparava aulas, arrumava a casa, pensava no jantar, na roupa para
passar, mudava fraldas, fazia papas e
biberões, adormecia de exaustão às dez e pico, acordava às duas,
acordava às cinco, levantava-me às seis a sentir que tinha sido
atropelada por um camião de cansaços. Não havia tempo nem disposição
para aquilo que antes eram as minhas rotinas: ler, estudar, aprender... A
própria capacidade de pensar parecia turvada. Estou a "emburrecer",
pensava. Quando me perguntavam pelo mestrado, fazia um meio sorriso. O
primeiro livro que li depois da travessia foi um bálsamo e uma surpresa.
Afinal ainda conseguia ler. E apaixonar-me pelo que lia. Sem acreditar
sequer que algum dia voltasse a ser eu. Aquela eu. E contudo desde as
histórias às cantigas, ao bolo feito a duas ao sábado, aos jogos, ao
"vamos pintar no terraço", aos desenhos animados enroscadas uma na
outra, às cantorias à volta do sofá a cantar" está no ar o Batatoooooon"
ou o Bueréré, tudo isto fez amadurecer um outro eu, o " eu mãe", sem
dúvida um dos eu que mais trabalho me dá, mas sem o qual me seria
impossível viver.
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