Nesse tempo é que era bom!

Paragem do autocarro. Expansiva, expressiva e cheia de vontade de falar, que é uma coisa bem distinta de conversar. Criticou o mundo de hoje, e sentenciou com solenidade: "eu tenho 51 anos e tenho saudades do tempo antes do 25 de abril, quando as pessoas eram honestas e sérias". 
Eu devia ter-lhe perguntado que idade tinha quando se deu o 25 de abril. Não o fiz porque as contas foram automáticas na minha cabeça. Com 8 anos, que memórias desse tempo glorioso teria? 
Ela continuava: agora os homens batem nas mulheres, e alguns até as matam, basta ver na televisão. As mulheres são escravas dos homens. E dantes não havia nada disto. 
Lá tive que dizer alguma coisa. De lembrar que a mentalidade tradicional machista já vinha de longe, que a violência doméstica de que falava às vezes vinha do que se vira em casa (quantas vezes comportamentos criticados acabam por ser depois imitados? )... E acabei por dizer que nesse tempo de Salazar a pobreza era muita... 
Mudou o rumo à conversa, embrenhada em novas teorias sobre as pessoas que andavam de carro mas tinham o frigorífico vazio. 
Fui salva pelo autocarro que chegou. E ainda assim ouvia-a, lá ao fundo, em plena campanha numa plateia nova. 

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